O atraso salarial gera dano moral?

Antes de adentrarmos no tema propriamente dito, importante frisar o que significa “salário”.

Neste sentido, muitos doutrinadores divergem acercam do significado propriamente dito da palavra, uma vez que alguns se utilizam do termo “contraprestação”, como assinala a CLT, para designar salário. E outros preferem o vocábulo “retribuição” ao fundamento de que contraprestação reduz o contrato a uma relação de troca (trabalho como remuneração) sem atentar para o caráter do liame empregatício.

Logo, salário seria toda a contraprestação ou vantagem em pecúnia ou em utilidade devida e paga diretamente ao empregado, em virtude do contrato de trabalho. Outras curiosidades é que pode ser fixo ou variável, e geralmente é pago no 5º dia útil do mês, conforme previsão legal.

Dito isto, questiona-se: e caso esse salário for pago em prazo diverso do contratual gerando, portanto, atraso?

Neste caso, o atraso dá ao trabalhador o direito de aplicar a justa causa ao empregador (a chamada “rescisão indireta”), conforme artigo 483 da CLT, vejamos:

Art. 483 – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

Com a extinção do contrato o ex-empregador deverá pagar todas as verbas devidas até a audiência, sob pena de pagamento de 50% de seu valor (art. 467 da CLT), vejamos:

Art. 467. Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinqüenta por cento”.

De forma legal, estamos amparados quanto a rescisão indireta do contrato de trabalho, mas e quanto a danos morais, é realmente devido?

Para responder isto, trago um julgamento de um Recurso de Revista, processo nº 10444-83.2017.5.03.0165, de relatoria do Ministro Alberto Bresciane.

Segundo o relator, “o dano moral se configura pela mudança do estado psíquico do ofendido, submetido pelo agressor a desconforto superior àqueles que infligem às condições normais de sua vida. O patrimônio moral está garantido pela Constituição Federal, quando firma a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República, estendendo sua proteção à vida, à liberdade, à igualdade, é intimidade, à honra e à imagem d individuo, ao mesmo tempo em que condena tratamentos degradantes e garante a reparação por dano (arts. 1º, III, e 5º, caput e incisos III, V e X)”.

E continua: “no contrato sinalagmático que se estabelece no contrato individual de trabalho, incumbe ao empregador proceder, tempestivamente, ao pagamento dos salários (CLT, art. 459, §1º). O atraso no pagamento dos salários claramente compromete a regularidade das obrigações do trabalhador, sem falar no próprio sustento e de sua família, quando houver, criando estado de permanente apreensão, que, por óbvio, compromete toda a vida do empregado”.

Foi com isto, que o julgador deferiu pedido de danos morais ao reclamante, dando provimento ao recurso, para condenar as reclamadas da ação ao pagamento de indenização por danos morais em razão do atraso reiterado do pagamento dos salários da reclamante, no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Contudo, vale uma ressalva, não é todo atraso que poderá gerar danos morais ao empregado. Segundo a jurisprudência já massificada, é necessário existir REITERADOS atrasos salariais a fim de se ter configurado o dano moral pretendido, uma vez que, por questões alheias a sua vontade, pode o empregador, de forma pontual, realizar o pagamento dos salários de forma atrasada, o que, em tese não ensejaria danos de natureza moral.

Então, antes de ingressar com ação pleiteando tal pedido, interessante ter em mente que o atraso deverá ser reiterado a fim de se caracterizar o dano moral.

Fontes:

Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista / Vólia Bomfim Cassar. – 16. ed., ver. e atual. – [2. Reimpr.] – Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: MÉTODO, 2019.

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